terça-feira, 20 de março de 2012

Série Raízes - Kunta Kinte


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Ensino público e aplicação da Lei 10.639

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Logo Racismo é Crime

Mesmo com o advento da lei 10.639, que trata da reeducação das relações étnico-raciais e com as políticas antirracismo pautadas pelo Estado Brasileiro, o racismo explícito ou velado é problema entre educadores. De outro modo, pela força estrutural e estruturante do racismo brasileiro, os professores não conseguem uma discussão capaz de revelar os sujeitos e a problemática em questão.

Jornais, revistas, livros produzidos pelos governos federal, estaduais e municipais, teses e congressos, seminários, dentre outros meios, de um modo geral, dizem como se deve processar a discussão no interior da escola, mas mesmo assim a temática continua solta, portanto, descolada do cotidiano escolar, e não sujeita a nenhuma estratégia particular, proficiente e embasada teoricamente. Há poucos exemplos, a bem da aplicação da lei 10.639, que tratem da questão ao nível escolar, embora os pressupostos teóricos, formulados pelos estudiosos, pelo Movimento Negro e militantes antirracismo, aí estejam a dizer onde e porque a inadequação no trato do racismo ocorre.

Em vista disso, e levando em conta que o racismo está naturalizado e fossilizado no ensino público, é que propomos o seguinte encaminhamento, a saber: a discussão do racismo deve ser feita no cotidiano escolar e pressupõe seminários, debates com professores, educadores e a conseqüente introdução da problemática no projeto político pedagógico e currículo. Tal recorte significa, a tempo, a inclusão do negro enquanto tema, problemática, sujeito, autoria e cosmogonia.

Além de teoria, é indispensável um projeto claramente explicitado. O que não pode ser feito sem uma explícita intenção epistemológica, ou seja, adequada conceituação e materiais analíticos precisos.

A nossa tese é a de que o conhecimento sistematizado e os estudos poderão levar os professores a perceber com criticidade o racismo e os meios para combatê-lo e desnaturalizá-lo. Por estudos se entende um processo contínuo e construído além das datas comemorativas do dia 13 de maio, “Dia Nacional de Denúncia contra o Racismo”, e do 20 de novembro, “Dia Nacional da Consciência Negra”. Esses dois momentos críticos, herança do Movimento Negro, são apenas mobilizadores, em outras palavras, não garantem a construção de um projeto centrado no cotidiano. Por criticidade entende-se a capacidade de desmontar nas práticas pedagógicas, nos planejamentos pedagógicos, nos planejamentos curriculares, nos livros didáticos, no cotidiano e no sistema interno da escola, o apagamento do negro enquanto sujeito, problemática e cosmovisão. Os elementos analíticos, envolvendo a mudança de enfoque dos eventos comemorativos para o cotidiano, deverão conduzir o combate sistêmico que é, à guisa de precisão, o entendimento das múltiplas inter-relações do racismo à brasileira. Estamos enfatizando que a existência sistêmica do racismo exige também um combate sistêmico. Pois os sistemas de ações, idéias, teorias e discursos, quadro único no qual a história do racismo no Brasil se dá e igualmente a sua realidade concreta, ou seja, as políticas de branqueamento e silêncio, o mito de democracia racial e a fábula de cordialidade, formam um conjunto indissociável e muitas vezes contraditório.

Contraditórias são também as políticas que se referem ao enegrecimento físico e à Política - ideologia de branqueamento. Ambos são, o enegrecimento e o branqueamento, fundamentais para a compreensão, nos primórdios e no presente, do racismo à brasileira. Vale enfatizar que a promoção da imigração européia, para diluir a raça negra, foi a política consensual defendida pelo Estado Brasileiro e por vários ideólogos do branqueamento, dentre eles, Sílvio Romero, Oliveira Viana e Nina Rodrigues. Divergentes foram, no entanto, as propostas e as teorias no tocante à miscigenação como alicerce para a eugenização. O médico antropólogo Nina Rodrigues, para citar um nome emblemático, via a miscigenação, e por isso era contrário à mestiçagem, como um meio para o enegrecimento do país.

A previsão de Nina Rodrigues, de que dias negros viriam, pode ser constatada nos dias de hoje. É flagrante, depois de 123 anos da abolição jurídica do trabalho escravizado, o enegrecimento do país. O processo de branqueamento físico não se consolidou, no entanto, não obstante o progressivo enegrecimento do país, seu ideal, inculcado, como enfatiza Kabengele Munanga, “ficou intacto no inconsciente brasileiro”. Por conta dessa realidade, o racismo à brasileira é, servem como exemplo as inúmeras escolas brasileiras, reproduzido fielmente nos espaços e tempos de maioria negra.

Não é por outra razão que o racismo, no Brasil, exige um discurso para construir a sua invisibilidade e a permanente tradução dos militantes e intelectuais negros. Os discursos e práticas que, no sistema público de ensino significam a negação do negro e da cosmogonia afro-brasileira, em outras palavras, do conhecimento sistematizado na afro-diáspora, portanto, uma dupla alienação-negação, recriam permanentemente a ignorância. Ignorância, a exemplo do racismo à brasileira, naturalizada. Aliás, a naturalização do racismo, na contramão do enegrecimento físico do país, só pode ser efetivada, vale aqui a ênfase, através da política de silêncio.

Fausto Antônio – Setorial de Combate ao racismo do PT e Movimento Negro

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Natural de Campinas, pontepretano, professor universitário, escritor, poeta, dramaturgo, militante do movimento negro brasileiro e do setorial de combate ao racismo do PT.